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Crónica de uma estreia absoluta na terra…

miguelnunecrono15Após 9 anos seguidos de competição no Campeonato de Ralis da Madeira, sempre em asfalto muito limpo, e num ano em que decidimos interromper essa assiduidade, decidimos colocar dois grandes desafios a nós próprios.

O primeiro havia sido superado com sucesso com a nossa participação no Rali Vinho Madeira a bordo de um Ford Fiesta R5, onde nos propusemos lutar com pilotos conceituados e bem apetrechados por um lugar de destaque na prova.

Partíamos com bom conhecimento do terreno, mas com total desconhecimento da viatura, apenas 60 kms de testes e uma possível falta de ritmo dada a paragem já de 9 meses desde a última prova realizada.

Com a enorme satisfação do resultado alcançado neste primeiro desafio, achamos então que seria altura para colocar aquele que consideramos o maior dos desafios da nossa carreira nos ralis. Partir para um terreno completamente desconhecido, num piso que nunca antes experimentado, andando 100% por notas. Foi assim que surgiu a nossa inscrição na prova de Mortágua 2015, uma vez que este ano se realizava em terra e com míticos mas muito duros troços do Rali de Portugal, achamos que seria a prova ideal para esta aventura.

De uma forma simples e prática montamos todo o programa, recorremos à RMC para nos alugar uma viatura, um Mitsubishi Evo X grupo N, marcamos viagem, aluguer de uma viatura no Porto para nos deslocarmos até Mortágua e reconhecermos a prova. Por imperativos profissionais, não nos era possível despender muito tempo para a preparação da prova, pelo que apenas na quarta-feira ao final do dia viajamos para o Porto e de seguida para Mortágua, chegando já durante a noite.

Foi aí que começamos a nos aperceber que o desafio era muito maior do que estávamos a contar, em conversa com colegas apercebemo-nos que a viatura que disponha-mos para os reconhecimentos não estava minimente adequada, e que até se corria o risco de não conseguir reconhecer a prova pois tratava-se de uma viatura normal e com pneus de estrada normais. Prontamente todos os colegas que estavam connosco num gesto de amabilidade que muito nos tocou, tudo fizeram para tentar encontrar uma solução, mas infelizmente já não havia tempo para grandes soluções…

Aí sentimo-nos um pouco perdidos, mas como ilhéus que somos tínhamos de nos “desenrascar”, e não havia mesmo outro remédio se não tentar passar pelos troços mesmo com aquele carro e correndo o risco de ficarmos “atascados”. Descansamos um pouco, e na quinta feira bem cedinho lá fomos nós muito devagarinho tentar colher as melhores notas possíveis para depois realizar a prova com pelo menos o mínimo de conhecimento.

Claro está que muito tempo demorávamos para passar em cada troço, mas lá conseguimos passar 3 vezes em cada classificativa, o que se mostrava significativamente pouco até porque naquelas condições e com aquela viatura era muito difícil ter a noção do que se ia passar depois em ritmo de corrida, para assim termos notas mais acertadas.

Confesso que, mesmo tendo noção que haveria muitas notas por corrigir, foi um enorme alívio quando conseguimos ter as notas de todas as classificativas. Pelo meio deste dia, ainda tivemos oportunidade de dar uma pequena volta ao lado do João Barros, que amavelmente teve essa atenção connosco, e levamos aquele choque com a realidade da terra, não nos passava pela cabeça que era possível andar tão depressa em cima de terra como tivemos oportunidade de ver com o João Barros.

Terminados os reconhecimentos na quinta-feira, na sexta feira era dia de outras novidades. Apesar da prova começar nesse próprio dia, nunca tínhamos rodado nem 1 metro em cima de terra sem ser no pequeno teste ao lado do João Barros, a nossa experiência era mesmo nula.

Apenas na sexta-feira de manhã chegava a equipa da RMC com a sua estrutura e a viatura que íamos utilizar na prova, pelo que só aí foi mesmo a primeira vez que conduzi um carro de ralis em cima de terra. Por condicionantes orçamentais, não disponha-mos de muitos kms para realizar testes, apenas 30 Kms o que é sem dúvida insuficiente para quem não tem experiencia nenhuma. Dentro desses curtos testes, tentamos aprender o máximo e perceber como podíamos andar em terra sem pelo menos sair da estrada. Agora mais conscientes das dificuldades que se avizinhavam, não conseguíamos esconder uma enorme cara de satisfação pelas primeiras sensações de andar naquele tipo de piso, a diversão é indiscritível…

Tudo a postos para iniciar a prova, mas as novidades ainda não tinham acabado, logo à noite havia uma superespecial, mas em asfalto com os carros preparados para terra… Aí não havia hipótese para o mínimo teste para ter algum feeling do carro nessas mesmas condições, seria mesmo no curto traçado da superespecial é que o tínhamos de descobrir.

E assim começou a nossa prova, na sexta-feira a noite com a superespecial de Mortágua, onde nas primeiras curvas andávamos completamente à procura de perceber a que velocidade e como se deveriam descrever as curvas, as travagens… etc.

Sábado de manhã era o grande dia, 23 kms para começar na famosa classificativa da Aguieira, onde se não ouvisse a nota não fazia a mínima ideia do que tinha pela frente. Se para mim ao volante as coisas eram muito difíceis para descrever curvas sem tocar em nada no meio de tantas “ratoeiras”, para o João Paulo também não seria nada fácil cumprir uma PEC tão grande sem se perder no meio de tantas notas com o carro a balançar de um lado para outro perdendo assim a noção da estrada que facilmente tinha no asfalto. Chegar ao fim deste troço sem tocar em nada e sem nos termos perdido nas notas foi logo motivo de grande satisfação.

Para a 2ª PEC, percebemos logo que havia muitas coisas a melhorar, começando pela pressão dos pneus, que chegaram ao final da 1ª PEC com uma pressão elevadíssima. Corrigindo este erro, e sendo a 2ª PEC mais pequena e a única que tivemos acesso a um vídeo antes dos reconhecimentos, chegando lá já com as notas pelo menos esboçadas, sentimos mais alguma facilidade o que se reflectiu logo no tempo averbado, que apesar de não ser extraordinário era já um pouco mais simpático.

Na 3ª PEC, repetíamos a passagem pelos 23 Kms da Aguieira, onde conseguimos já corrigir alguns erros da primeira passagem retirando 32 segundos ao tempo averbado o que demonstra bem a falta de conhecimento.

Para a parte da tarde restavam duas passagens pelos duríssimos 18 Kms da Tojeira, sem dúvida a classificativa com piso mais duro para as máquinas, e a repetição de Rigueiras. Na primeira passagem pela Tojeira, dado ao estado do piso nos reconhecimentos, aqui quase não conseguíamos efectuar os reconhecimentos porque em algumas zonas era muito difícil passar com um carro de dia a dia, mas se calhar por ter sido o ultimo troço que tiramos notas, sentimos que as notas estavam bem melhores que na Aguieira o que nos deu alguma confiança e chegamos ao fim mesmo da primeira passagem satisfeitos com o desempenho.

Muito motivados para a segunda passagem em Rigueiras, onde a primeira passagem tinha deixado boas perspectivas, ficamos de alguma forma desolados quando a meio desse troço, o catalisador do Mitsubishi entupiu completamente, perdemos toda a potência do carro pois assim deixava de fazer pressão de turbo. Até ao problema se iniciar vínhamos a retirar já cerca de 5 segundos à primeira passagem, mas acabamos por chegar ao fim lentamente e a piorar 16 segundos para a primeira passagem.

Para a ultima classificativa, que queríamos cumprir a todo o custo, por forma a minimizar o problema, conseguimos abrir um buraco no escape antes do catalisador, por onde escapavam mais gases, melhorando assim a performance do motor significativamente.

Foi talvez nesta classificativa que conseguimos já impor um ritmo mais forte, apesar do carro não estar a 100%, já vínhamos com alguma confiança das notas da primeira passagem e já algum mais à vontade com tudo, nos últimos kms sentimos mesmo uma adrenalina enorme e a certeza que queremos voltar a repetir a presença em provas de terra. A caminho do pódio aconteceu o pior, com o catalisador a entupir novamente, o motor sobreaquecia e como o resultado era o menos importante para nós, não arriscamos causar nenhum dano no motor do carro e optamos por abandonar a prova.

De qualquer forma não deixamos de sentir que esta experiência foi muito positiva, algo que se calhar já devíamos ter feito há mais tempo…

Um abraço a todos os adeptos dos ralis

Miguel Nunes

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